A HISTÓRIA NÃO É A AVENIDA NEVSKY
(Apresentação da obra de V.A. Vazyulin)
“O mais alto nível de crítica aos
adversários
é a resolução positiva do problema em si”
V.A. Vazyulin
A diferença, apontada por Tchernichevsky
[1],
entre a rectilínea avenida Nevsky, que, com os seus
4 km
e meio, atravessa o coração de Leninegrado e o complexo
devir histórico da humanidade legitima a exigência de
uma apreensão teorética do real que não se compadeça,
nem com a rudimentar aplicação de esquemas, nem com o
encantamento face ao imediato e ao circunstancial. Só a
captação e reconstituição da efectividade
permitem ver, para além do superficial, o movimento
imanente que, não raramente, se desdobra exteriormente
num sentido aparentemente inverso ao real. A história
mundial é sinuosa, plena de voltas e contravoltas,
recuos e avanços. Mas é nessa contraditória, irregular,
assíncrona trajectória, como que aleatória, que se
articula e desdobra a lógica da história.
A realidade hodierna aparece como uma
inversão do movimento efectivo da história. A União
Soviética, e quase todos os antigos países socialistas,
voltaram ao capitalismo. A ordem burguesa adquiriu
status de modo natural de vida, foi
proclamado o fim da história. A luta de
classes passou a ser vista como uma coisa do passado e
os choques entre civilizações são hoje
apresentados como o núcleo das contradições do "mundo
globalizado". Marx, tal como acontecera com Spinoza e
Hegel, é agora visto por muitos como um "cão morto". Os
movimentos sociais actuam predominantemente de modo
retroactivo, apenas resistindo ao impetuoso avanço do
capital, sem clareza quanto ao rumo a seguir.
Cepticismo, insegurança e até mesmo auto-fobia tomaram
posse de muitas pessoas progressistas. Nem mesmo a
actual crise do capitalismo levou à superação desta
desorientação. No entanto, por paradoxal que pareça, o
marxismo pode repetir a resposta de Mark Twain à
publicação de seu obituário no New York Journal:
"Os rumores da minha morte foram muito exagerados".
Nós vivemos numa época de recuo, em que a
toupeira da história sedimenta forças
colossais para mais um salto
em frente. Esses reveses históricos não
são novos. A absolutização conjuntural do momento
histórico bloqueia uma percepção mais ampla do processo
em curso, mas, na verdade, nenhuma nova formação
económico-social foi estabelecida sem estes reveses
temporários.
Nesta época de temporário retrocesso,
importa não apenas manter posições a nível político e
social, a defesa intransigente das conquistas
alcançadas, a força de espírito e as convicções, mas
também reflectir sobre o percurso percorrido e preparar
teoricamente o tempo vindouro, em que todas as nossas
forças serão, mais uma vez, colocadas à prova. Nestas
fases da história, importa ter presente que apenas a
preparação teórica permite a resolução positiva de
tarefas históricas incomparavelmente muito mais
complexas do que em qualquer período passado. Nunca, na
história, a teoria teve um papel tão importante como
agora.
A
sociedade em que vivemos, a sociedade burguesa, foi pela
primeira vez investigada enquanto totalidade dialéctica
concreta, enquanto totalidade social orgânica
,
por Karl Marx que, na sua obra magna, “O Capital”,
procedeu ao estudo sistemático e à reconstituição
teórica do capitalismo, demonstrando o seu funcionamento
e o seu carácter transitório.
A Economia Política burguesa, não podendo
continuar o movimento cognoscitivo até ao desvelamento
da essência da sociedade burguesa (e a consequente
revelação do seu carácter historicamente limitado),
conclui o seu movimento ascendente e converte-se
definitivamente em economia política vulgar, passando a
tratar fundamentalmente (e ao nível do mero
entendimento), de esferas mais afastadas da essência da
sociedade burguesa (mercado, preços, marketing, taxas,
movimentos das bolsas, política económica, etc.). A
economia política derivou
em Economics. Esta
desistência gnosiológica atesta a asserção de que, a
partir do aparecimento do marxismo clássico, a relação
de toda e qualquer investigação da esfera da produção ou
da sociedade como um todo, tem, na sua relação para com
o marxismo, o seu critério de cientificidade.
O
marxismo, porém, não foi sempre encarado como uma teoria
em desenvolvimento. Após Marx, apesar do crescimento do
movimento revolucionário, a maioria dos marxistas viu o
marxismo como uma teoria estanque, a ser apenas
aprendida e seguida, sem reflexão autónoma. Lenin será,
a contrapelo desta tendência, o expoente máximo do
desenvolvimento do marxismo pela linha magistral. A sua
actividade vai decorrer (e não por acaso) num novo
período histórico, na fase imperialista do capitalismo,
na época das revoluções proletárias e do surgimento do
socialismo. Lenin compreendeu que para o desenvolvimento
do marxismo é necessária a compreensão da sua
metodologia, para o que aponta o estudo de Hegel e o
conhecido aforismo segundo o qual “não é possível
compreender plenamente o “Capital” de Marx e
particularmente o seu primeiro capítulo sem ter estudado
a fundo e sem ter compreendido toda a lógica de Hegel.
Por conseguinte, ½ século depois nenhum marxista
compreendeu Marx!!”
.
A revolução de 1917[4],
pela sua dimensão, verdadeiramente titânica, e as
inúmeras dificuldades inerentes às tarefas
revolucionárias e à construção do socialismo, a par da
curta vida de Lenin, não lhe permitiram levar a cabo, de
modo ainda mais profundo, o desenvolvimento do método
marxista.
Durante o período de transformação
revolucionária, vão ser ensaiadas algumas tentativas. A.
M. Deborin vai, seguindo a exortação de Lenin, tentar
delinear a ligação entre as posições marxistas e a
filosofia hegeliana. Mas o contexto histórico, a par de
outras circunstâncias, tanto de carácter objectivo como
subjectivo, não possibilitaram ir além de uma análise
escolástica e abstracta de Hegel. A especificidade de
Marx era vista fundamentalmente em termos analógicos,
por contraposição, como diferença em relação a Hegel e à
concepção idealista em geral. Não
era possível, neste embasamento epistemológico, criticar
positivamente Hegel.
Dos anos 30 aos anos 50, as tarefas de
construção do socialismo, permanentemente ameaçado e
construído numa base material ainda não adequada, vão
levar a uma (praticamente inevitável) hipostasia do
controle político sobre a teoria. As tarefas de
propaganda e agitação tomaram a supremacia em relação ao
aprofundamento teórico-metodológico, tornando quase
impossível as investigações fundamentais. O requerido
avanço teórico, imprescindível ao delinear estratégico
dos contornos da nova sociedade, ressentiram-se dessa
circunstância.
Embora a prática de construção do
socialismo (novas tarefas, novos fenómenos a serem
avaliados, a experiência histórica, o fomento cultural,
etc.) impulsionasse o incremento teórico em geral,
formando quadros, fornecendo material e tornando
necessária a sua apreciação, as circunstâncias concretas
levaram a uma, praticamente inevitável, colagem entre a
economia política e a política económica, colagem entre
a teoria política e a política, colagem entre a
filosofia social e a necessidade de justificação teórica
das transformações sociais levadas a cabo. A teoria
funde-se com a prática, não revela a sua especificidade.
Isto era, em certa medida, uma situação historicamente
necessária, mas que não permitia o avanço teórico. O
estudo das bases metodológicas do marxismo exige um
elevado nível de criticidade e reflexão da teoria sobre
si mesma.
Na passagem dos anos cinquenta aos anos
sessenta, as condições objectivas, relacionadas com os
limites do avanço predominantemente extensivo da
economia socialista, colocaram a necessidade de uma nova
posição em relação às relações de produção e ao nível
superestrutural em geral. Concomitantemente
(e talvez não por mero acaso histórico), verificou-se um
afrouxamento do controle sobre a produção intelectual, o
que permitiu uma relativa independência da teoria em
relação à prática política imediata e a abertura de
novas perspectivas teóricas do marxismo.
Uma vez
que o marxismo não é um dogma, o estudo da sua base
metodológica é essencial. O desenvolvimento teórico do
marxismo está intrinsecamente ligado às investigações
acerca do método marxiano, consubstanciado em “O
Capital”, o método de ascensão do abstracto ao
concreto. Marx expôs, sucintamente este método na
introdução à obra “Para a crítica da economia política”:
“Parece correcto começar pelo real e o concreto, pelo
que se supõe efectivo; (…). Contudo, a um exame mais
atento, tal revela-se falso. (…) Se começássemos
simplesmente [pelo concreto sensível] (…), teríamos uma
visão caótica do conjunto. Por uma análise cada vez mais
precisa, chegaríamos a representações cada vez mais
simples; do concreto inicialmente representado
passaríamos a abstracções progressivamente mais subtis
até alcançarmos as determinações mais simples. Aqui
chegados, teríamos que empreender a viagem de regresso
até [ao concreto, porém] (…) desta vez não teríamos uma
ideia caótica de todo, mas uma rica totalidade com
múltiplas determinações e relações. (…) Eis,
manifestamente, o método científico correcto. O concreto
é concreto porque é a síntese de múltiplas determinações
e, por isso, é a unidade do diverso. Aparece no
pensamento como processo de síntese, como resultado, e
não como ponto de partida, embora seja o verdadeiro
ponto de partida, e, portanto, também, o ponto de
partida da intuição e da representação. No primeiro
caso, a representação plena é volatilizada numa
determinação abstracta; no segundo caso, as
determinações abstractas conduzem à reprodução do
concreto pela via do pensamento”
.
O estudo metodológico sistemático da obra
maior de Marx desencadeia-se com os trabalhos de M.M.
Rosental, E.V. Ilienkov, V.N. Tipukhin, L.A. Mankovsky,
Z.M. Orudjev. Inicia-se uma nova abordagem do marxismo,
e do legado de Hegel, em que coexistiam já, embora
separadas e em instável equilíbrio, as críticas negativa
e positiva de Hegel.
Hegel, na sua crítica ao agnosticismo
kantiano, à separação entre o fenómeno e a
coisa em si (com consequências funestas
para a relação entre o ser e dever
ser), vai tentar abarcar toda a realidade natural,
social e o pensamento num sistema, que não era um
simples agregado ecléctico e de conhecimentos, como
outros sistemas idealistas, mas um sistema intrínseca e
dialecticamente ligado
[6].
Hegel resolveu a tarefa a que se propôs em bases
idealistas, vendo a realidade objectiva como resultado
do auto-movimento do pensamento. O pensamento, por sua
vez, não é visto como reflexo da realidade objectiva,
como apreensão de um objecto concreto e determinado.
No entanto, como salientou Marx, no
Posfácio à Segunda Edição Alemã (1872) do
Primeiro Volume de «O Capital»,
“A
mistificação que a dialéctica sofre às mãos de
Hegel de modo nenhum impede que tenha sido
ele a expor, pela primeira vez, de um modo abrangente e
consciente as suas formas de movimento universais”
.
A contradição, salientada por Engels e
Lenin entre o sistema e o método hegelianos pode levar,
se não for devidamente compreendida, a conclusões
superficiais e erróneas: 1) a de que no sistema
hegeliano nada é importante; 2) a de que a estrutura
dinâmica e sequencial da lógica hegeliana, a
sequencialidade que levaria, se referirmos apenas os
pontos nodais, do ser à essência,
e desta ao fenómeno e à
efectividade, seriam um mero arcabouço sistémico do
método. Este resumir-se-ia (após um procedimento
antisséptico, tendente à expurgação dos
momentos idealistas) a uma utilização pontual de
determinadas categorias e leis dialécticas. Embora haja
uma contradição entre o método e o sistema hegeliano, é
de salientar que tanto a genialidade como a debilidade
idealista de Hegel permeiam todo o sistema e
toda a lógica. Em relação ao sistema, há que
precisar que o problema do sistema hegeliano não se
prende com o facto de ser um sistema, mas com o facto de
ser uma concepção idealista de sistema, considerado
absoluto, fechado em si mesmo; o mesmo problema
prende-se com a lógica hegeliana, cujo idealismo não
permite a Hegel passar da coisa da lógica
para a lógica da coisa. Deste ponto de
vista, a inter-relação entre método e sistema afigura-se
mais complexa, mas só assim a importância de Hegel é
revelada de um modo mais profundo e profícuo. A
importância da estrutura dinâmica da lógica
objectiva de Hegel é frequentemente obnubilada, no
entanto, ela guarda uma directa correlação com o método
de ascensão do abstracto ao concreto
em Marx. Certamente, era
fundamentalmente a este aspecto e a esta correlação que
se referia Lenin no incitamento supracitado.
A crítica a que se submeteu, no Ocidente,
a filosofia hegeliana, e a sua lógica em particular,
serviu frequentemente não só e não tanto para criticar
as limitações idealistas deste grande filósofo mas,
principalmente para criticar a possibilidade de
compreensão sistemática da essência dos
fenómenos, atacar o determinismo, etc. Para
o filisteu, toda e qualquer aproximação teórica
sistemática da realidade é identificada com uma visão
dogmática, todo e qualquer sistema é identificado com um
totalitarismo da razão. No entanto, o problema dos
grandes sistemas metafísicos residia mais no seu
carácter metafísico do que no seu carácter sistemático.
A apropriação meramente parcelar, fragmentária, da
realidade, que fez caminho, conduziu à negação da
possibilidade do conhecimento da essência dos fenómenos
e da concretude real
[9].
Como foi referido, a compreensão do
método marxiano concretizado em “O Capital”, afigurou-se
como caminho necessário ao desenvolvimento teórico do
marxismo. “O Capital” tem uma importância fulcral em
termos metodológicos, uma vez que nele foi efectuada
pela primeira vez a ascensão do abstracto ao concreto a
partir de uma posição dialéctico-materialista.
Apesar do referido incitamento de Lenin,
passaram-se várias décadas sem que tenha sido
empreendido o estudo sistemático da metodologia de “O
Capital” através da abordagem da obra enquanto
totalidade orgânica. As diversas contribuições teóricas,
limitaram-se, basicamente, à compilação “sistemática” de
referências metodológicas explícitas no corpo desta
obra. A utilização de “O Capital” na qualidade de
referencial exemplificador de aplicação de categorias ou
blocos temáticos para posteriores construções
arbitrárias revela, no fundo, uma percepção da lógica
dialéctica distinta da marxiana
[10].
Procurou-se a presença pontual e
exotérica da dialéctica na obra marxiana, quando na
realidade, o método marxiano se encontrava na dinâmica
esotérica total da obra, estava, por assim
dizer, embebido no sangue e carne da obra. Rozental,
Tipukhin, Mankovsky, Orudjev e até mesmo Ilienkov, (sem
falar de autores estrangeiros da denominada “nova
dialéctica”, como R. Rosdolsky, J. Zelený, etc.) não
foram além, nos termos metodológicos aqui referidos, da
utilização de “O Capital” para exemplificar categorias e
sua inter-relação estrutural ou ao estudo isolado de
blocos temáticos. Não chegaram, assim, à decifração
consequente da estrutura integral da obra. Mesmo os
investigadores mais consequentes e incisivos, Ilienkov e
Mankovski, apenas se aproximaram dessa percepção do
capital enquanto totalidade orgânica, sem, no entanto, a
realizarem plenamente.
Tendo por base os trabalhos referidos,
acerca da metodologia esotérica de “O Capital”, V.A.
Vazyulin
[11]
vai dar início a uma nova compreensão do marxismo e
levar a cabo a aplicação criadora do resultado dessas
investigações.
A importância da obra de V.A. Vazyulin,
“A lógica de ‘O Capital’ de Karl Marx”
(1968) deve-se ao facto de, pela primeira vez ter sido
levada a cabo, de modo positivo, sistemático e pleno, a
tarefa assinalada por Lenin em 1914. A lógica marxiana é
estudada não como soma de afirmações de Marx sobre o seu
método. V.A. Vazyulin não se dedica a um “recontar” da
obra marxiana nem à tentativa de encontrar em “O
Capital” de Marx um arquivo, um repositório, de exemplos
de aplicação de categorias dialécticas, nem ao mero
estudo de blocos temáticos. A obra referida pretende a
compreensão sistemática, metodologicamente consequente,
de “O Capital” enquanto totalidade orgânica que procura
reproduzir a estrutura e movimento de outra totalidade
orgânica, a sociedade capitalista. É consumada uma
investigação sistemática e integral da lógica do
capital, enquanto totalidade dialéctica de subordinação
categorial. As próprias categorias lógicas só se tornam
verdadeiramente categorias lógicas quando inseridas no
sistema categorial. A tentativa de estudar as categorias
isoladamente, ou mesmo construir um sistema de
categorias lógicas desligadas de um todo orgânico, é
incompatível com a dialéctica materialista
[12].
Nesta obra, em que a tónica incide,
explicitamente, nos momentos de continuidade entre os
métodos de Hegel e o de Marx e não tanto na critica
negativa ao idealismo hegeliano, vai ser explanada a
inter-relação intrínseca entre o método de Marx e Hegel.
Ficou claro que esta inter-relação, assim como o núcleo
racional da lógica hegeliana é muito mais profundo do
que se poderia supor. Até a estrutura geral da obra de
Marx, na sua ascensão do abstracto ao concreto, reproduz
(embora de modo específico e com diferenças
fundamentais), a estrutura da lógica hegeliana (ser-essência-fenómeno-efectividade
e as categorias de transição
[13]).
A elucidação da lógica de “O Capital”
tornou clara a especificidade do método de Marx em
relação ao hegeliano. O alicerce onto-gnosiológico
fundante dessa especificidade prende-se com o facto de
Marx partir de uma posição dialéctico-materialista e,
consequentemente, elaborar a sua lógica na investigação
de um objecto concreto, específico, determinado,
enquanto Hegel trata da lógica em geral.
Em “O Capital”, Marx vai, no livro
primeiro, do ser (Mercadoria e dinheiro), à
essência (mais-valia e produção do
capital): no livro segundo, apresenta a circulação do
capital (fenómeno): no livro terceiro,
extremamente incompleto, chega à efectividade
do capitalismo (processo de produção capitalista como um
todo)[14].
Marx vai do ser (dimensão superficial), da
mercadoria (essa “célula”,
elemento primordial, relação
mais simples,
elementar, da sociedade burguesa) para a
essência e desta para o fenómeno e
efectividade.
O movimento do concreto sensível ao
abstracto não é uma contraposição absoluta à ascensão do
abstracto ao concreto não é um andaime, retirado após a
conclusão da obra. A ascensão não é um caminho unívoco
“em sentido inverso”. O movimento do concreto sensível
ao abstracto e deste ao concreto enquanto totalidade
rica em determinações (e desta à prática) não são vistos
como etapas isoladas, mas como uma espiral dupla em que
pode predominar o movimento do concreto ao abstracto ou
(no caso de Marx) a ascensão do abstracto ao concreto.
Nesta, o movimento do concreto sensível ao abstracto não
é totalmente eliminado, antes é suprassumido, enquanto
momento necessário, subordinado e subsumido, da ascensão
do abstracto ao concreto
[15].
A absolutização da ascensão do abstracto ao concreto
revela uma subestimação do papel constante da
experiência para o conhecimento. Se a ascensão se
apresentar como única articulação constitutiva
do concreto pensado, o papel da prática e dos novos
dados fornecidos por essa prática para a correcção
continua da reconstituição lógica do objecto são
menosprezados
[16].
Em todos os momentos da investigação, o objecto deve ser
visto enquanto totalidade presente e concreta, ele deve
pairar durante todo o processo perante o
olhar indagador do investigador.
A dialéctica marxista anunciou-se muito
mais complexa do que a hegeliana. Em primeiro lugar, a
lógica de Marx é uma espiral dupla, em que o movimento
do concreto sensível ao abstracto se mantém na ascensão
do abstracto ao concreto. Nesta espiral dupla, podemos
encontrar três hélices, uma grande hélice que reflecte o
objecto no presente, uma hélice menor que reflecte o
passado, enquanto momento subsumido e suprassumido no
presente (capítulo da mercadoria e dinheiro)
[17]
e uma hélice que reflecte as premissas (no objecto dado)
da superação ulterior do objecto, uma vez que a
apropriação consequente do imanente desvela
já os germes do iminente.
Por seu lado, a lógica hegeliana
constitui uma espiral única, em que a ascensão do
abstracto ao concreto é absolutizado, sendo o movimento
do passado ao presente diluído no presente, uma vez é
visto, em certa medida, como momento ilusório do
verdadeiro processo de conhecimento. Isto fecha o
caminho para a compreensão do devir real do objecto e da
sua ulterior transformação
[18].
O desvendamento da lógica de “O Capital” permite a
ultrapassagem dialéctica, não só da posição positivista
em relação ao conhecimento, como também da abordagem
idealista, de cariz hegeliano, que, de certo modo, marca
parte dos trabalhos de marxistas.
Superou-se a ideia de que a ascensão do
abstracto ao concreto partiria directamente da
essência e de que acabaria no fenómeno.
Mesmo Ilienkov considerava que Marx teria começado
verdadeiramente a ascensão do abstracto ao concreto
apenas a partir do valor (e não da mercadoria). Assim
sendo, a ascensão do abstracto ao concreto seria uma
ascensão realizada directamente a partir da
essência, sem que as suas premissas fossem
significativas. Mas se tal ocorrer, a reconstituição do
objecto adquire um carácter dogmático e místico, o
objecto apresenta-se como desligado das suas premissas e
a constituição da sua essência não é
demonstrada. Porém, assim como o pensamento não cria o
objecto, a sua concretude também não pode ser
reconstituída unicamente a partir da essência,
sem premissas concretas, premissas essas que se mantêm
(embora de modo suprassumido, subordinado) durante toda
a existência do objecto. Marx, realmente, tencionava
inicialmente, começar a exposição do seu trabalho a
partir do dinheiro. Viu porém, que não o poderia fazer,
uma vez que a mercadoria era fundamental para o
desvendar e a demonstração consequente do mecanismo de
constituição do valor, intuiu que o ser
está indissoluvelmente ligado, enquanto momento
suprassumido e subsumido, à essência
[19].
A essência não pode ser, portanto, vista
como desligada do ser que a constituiu,
embora não deva, outrossim, ser confundida com o
ser, confundida com a relação
elementar
[20].
A partir dos resultados obtidos na obra
anterior, V.A. Vazyulin vai examinar o mecanismo de
“Constituição do método de Investigação
Científica de Karl Marx (aspecto lógico)” (1975).
Nesta obra, V.A. Vazyulin examina as concepções do jovem
Marx, período em que predomina o movimento do concreto
sensível ao abstracto. Marx, no seu percurso, vai da
crítica da religião à critica da política e desta à
critica da economia e à aclaração do carácter
determinante desta, ou seja, vai aprofundando a sua
compreensão da dinâmica social (ao mesmo tempo que se
aprofunda o seu carácter revolucionário).
Marx, no período em exame, ainda se
desloca preponderantemente do concreto sensível ao
abstracto. Nesta etapa, há como que uma miscigenação e
uma inversão de níveis: o que não é essencial é
considerado essencial e o que é essencial não é visto
como tal. Só em “O Capital”, tanto o objecto, como a
ciência e o investigador, se encontram num nível que
permite, de um modo praticamente optimal, a aplicação do
método da ascensão lógica.
V.A. Vazyulin sublinha a importância de
levar em conta, tanto o mecanismo de passagem de um
nível de apreensão a outro, como os níveis de
desenvolvimento do objecto, da
ciência do objecto e do investigador
(que podem ser bastante distintos). A correlação destes
níveis, marca de forma substancial, todo o processo de
investigação. Não se trata, aqui, de apenas
“contextualizar” a obra, é imprescindível ter em conta
estes movimentos distintos (o nível de desenvolvimento
do objecto de estudo, da ciência e do investigador),
para compreender a especificidade de cada obra marxiana.
Não existe uma filosofia marxiana estanque, dada de uma
vez por todas, mas sim um progredir de Marx, que se
desenrola pela resolução de contradições internas. Só o
destrinçamento destes momentos e níveis permite avaliar
cada obra de Marx na sua especificidade histórica,
perceber que problemas resolvia em cada obra sua.
O referido trabalho de V.A. Vazyulin
permitiu, ainda, perceber o carácter necessário e o
estatuto heurístico dos enganos, ilusões, no processo de
conhecimento. As insuficiências, os enganos, no
movimento consequente do concreto ao abstracto (como
ocorre em pessoas geniais, caso de Hegel e Marx) são
momentos necessariamente inerentes ao processo de
conhecimento e guardam em si as contradições que
permitem o avanço ulterior do conhecimento, não podendo
ser vistos como simples erros, fadados a um impiedoso e
pouco dialéctico “corte epistemológico”. Não se pode
ficar apenas com o Marx maduro (inglória e pouco
dialéctica tentativa althuseriana), é necessário
igualmente compreender o percurso que o levou á obra.
Este percurso guarda muito de positivo e ajuda a
entender melhor o Marx maduro. Claro que o recurso
anti-dialéctico de entender o marxismo tendo por base
unicamente no “jovem Marx”, etapa em que predomina o
movimento do concreto ao abstracto e não foi descoberta
a essência da sociedade capitalista, se situa ainda mais
longe do marxismo real.
Em “A constituição do método” V.A.
Vazyulin mostra que qualquer totalidade orgânica
atravessa necessariamente as etapas de Início, de
surgimento do objecto, de formação e maturidade. Na
etapa inicial, formam-se as premissas do
objecto. Na etapa de surgimento, assiste-se
ao aparecer da sua essência. O estádio de
formação corresponde à transformação
paulatina do seu fundamento pela nova essência.
A etapa de maturidade corresponde ao nível
em que a essência pode expandir-se numa
base adequada e em que se abre a possibilidade da sua
transformação radical.
Após a explicitação do mecanismo de
constituição do método marxiano, V.A. Vazyulin vai
empregar os resultados obtidos como suporte metodológico
da teoria sobre a sociedade.
As questões teóricas acerca da
metodologia de estudo da sociedade foram, a partir dos
anos 50, objecto e campo de intensos debates teóricos na
União Soviética. Em 1956, V.J.Kelle e M.Ya. Kovalson
fazem uma crítica da abordagem mecanicista do
materialismo histórico, e afirmam a necessidade de uma
intelecção sistemática do social, dando início ao
desencadear de inúmeras discussões acerca dos aspectos
teórico metodológicos do estudo da sociedade, que se
prolongou pelas décadas de 60 e 70. Nos anos setenta,
V.P. Tugarinov, V.P. Rojin propunham uma classificação
da estrutura social enquanto momentos justapostos; A.V.
Drozov e outros apresentavam uma proposta de sistema
integrado, mas sem levar em conta a dinâmica histórica.
Muitas obras da época primavam pelo eclectismo, tentando
afirmar a compatibilidade extrínseca de teorias e
métodos distintos (como em K.Kh.Momdjyan). Mas a noção
da insuficiência destas posições era sentida: Yu.K.
Pletnikov, V.S. Barulin vão propor
uma abordagem sistémica mas em que o método de ascensão
do abstracto ao concreto tivesse a primazia. Foram mesmo
afirmadas a necessidade de tratamento do todo social
enquanto totalidade orgânica. No entanto, a ausência de
uma compreensão metodológica sistemática do marxismo e a
inconsequência ideológica levaram vários autores a
construções eclécticas, com base na análise
sistemico-estrutural, não dialéctica e não propriamente
marxista.
Pesem algumas contribuições teóricas
positivas, permanecia, de modo geral, uma separação
entre o materialismo histórico e o estudo da metodologia
marxista. A lógica, a dialéctica e a teoria do
conhecimento eram tratados em monografias e manuais de
um modo abstracto, separado do estudo integral de
qualquer objecto concreto
[21].
Na obra “A lógica da história”
(1088) V.A. Vazyulin vai aplicar os resultados das suas
investigações anteriores ao estudo da sociedade enquanto
totalidade orgânica. Nesta obra, procura fazer avançar o
marxismo pela sua via magistral, pela consequente
suprassunção (aufhebung) do marxismo
clássico e do materialismo histórico marxiano numa
teoria mais ampla
[22].
Na tentativa de aplicação do método
lógico ao estudo da sociedade futura, ficou claro que o
método histórico não deve ser visto como simples
complemento ao método lógico e que a supremacia de um
deles, depende do nível a que se encontra o objecto de
investigação. O método da ascensão do abstracto ao
concreto não torna menos relevante a importância
heurística da abordagem histórica, não se resumindo este
último, à aplicação do que é obtido pelo método de
ascensão do abstracto ao concreto. A concepção do
objecto enquanto totalidade orgânica pressupõe a unidade
(não a identificação) entre as abordagens lógica e
histórica. A ascensão do abstracto ao concreto é
possível, em pleno sentido, apenas quando o objecto de
estudo atinge a sua maturidade. Para um objecto em
formação, tem primazia a abordagem histórica. No
entanto, uma primeira abordagem lógica da sociedade como
um todo já é possível, uma vez que o comunismo já fez a
sua entrada em cena na história (na sua fase
socialista).
O estudo do marxismo mostrou o caminho a
seguir. Ficou claro que o comunismo não poderia ser
visto como mera negação do capitalismo, mas de toda a
pré-história da humanidade (esta incluiria
o capitalismo e todas as formações anteriores). Se o
comunismo nega toda a pré-história da humanidade e não
apenas o capitalismo, o estudo do socialismo como etapa
da sociedade comunista só poderia ter por base o estudo
da história da humanidade como um todo. Em Marx, a
sociedade comunista era vista predominantemente como a
negação do capitalismo (embora Marx, por outro lado,
também a visse como superação de toda a pré-história da
humanidade)
[23].
O desfazer esta ambiguidade tem
consequências teóricas e práticas de largo alcance:
enquanto negação de toda a pré-história, a edificação da
nova sociedade revela-se muito mais complexa, muito mais
intricada (e prolongada). A teoria marxiana da sociedade
e do comunismo não estava, e nem poderiam estar, no
mesmo patamar que a economia política do capitalismo,
devido, fundamentalmente ao nível dos objectos
em estudo. O materialismo histórico de
Marx estava em formação e a teoria do
comunismo ainda se encontrava ao nível da
constituição das suas premissas. Verificavam-se
compreensíveis ambiguidades tanto no que diz respeito às
características do comunismo como no que diz respeito à
estrutura social. Em relação a este último aspecto,
havia compreensível confusão entre a relação
elementar da sociedade e a sua essência.
O trabalho aparece simultaneamente como início (relação
elementar) e essência da sociedade. Mas
neste caso, não se percebe o mecanismo de constituição
do trabalho enquanto essência da realidade,
desaparece a historicidade do trabalho, mistifica-se a
essência humana.
A abordagem positiva do comunismo e a
distinção entre os níveis do ser e da essência da
sociedade permitem compreender de outro modo a
estrutura da sociedade. A consideração da relação
entre o ser humano e a natureza como a relação
elementar, primária, da sociedade permite perceber a
sociedade como unidade do social e biológico, superando
a dicotomia do reducionismo sociologizante ou
biologizante. No que diz respeito propriamente ao
marxismo, supera-se o reducionismo sociologizante, que
veria a sociedade como desligada das suas premissas
naturais. Ora, é exactamente esta relação entre a
essência social e as premissas naturais presentes e
subsumidas no social que permite compreender a dinâmica
dialéctica da história.
Na obra “A lógica da história”, V.A.
Vazyulin fez uso dos métodos lógico e histórico. Na
abordagem lógica, a sociedade é vista ao
nível do ser, da essência, do
fenómeno e da efectividade. O
nível do ser é o nível da
superfície, que só deixa de ser superficial à medida
em que se torna momento do desvelamento da
essência. Ao nível do ser da sociedade,
esta apresenta-se, como um conjunto de indivíduos[24].
Se nos abstrairmos da essência social do ser humano
(mantendo, no entanto, presente o seu carácter
essencial, determinante) uma vez que se trata da
reconstrução lógica do objecto de estudo, veremos que, o
mecanismo de satisfação das necessidades humanas
enquanto espécie, desemboca no trabalho, na produção,
que se revela como esfera da essência. Só
agora se pode falar propriamente da relação intrínseca
entre indivíduos, só agora se revela a essência social
do ser humano[25].
É no trabalho, na produção, enquanto relação humana
entre o ser humano e a natureza (portanto relação que
pressupõe necessariamente a sociedade) que a essência
social primordialmente se configura. Vimos, no entanto,
que o ser, a dimensão natural do ser humano, não
desaparece totalmente na essência, permanecendo como
momento suprassumido e subsumido na
essência[26].
Se não for revelado o mecanismo de constituição lógica
do social, o social aparece como algo místico, sem
premissas, um raio em céu sereno. Por outro lado, o não
reconhecimento do carácter essencial e social do
trabalho, levaria, inevitavelmente a entender o social
como relação extrínseca entre indivíduos.
O nível do fenómeno,
enquanto manifestação sensível da essência,
é o nível do social em sentido estrito, o nível da
actuação social, movimentos sociais, das formas de
consciência social, da superstrutura[27].
Em relação às formas de
consciência social, estas têm uma mediação distinta
no que concerne à sua relação com a essência.
O agir, o sentir e o pensar permeiam todas as formas de
consciência social, mas em distintos graus. Há formas de
consciência social em que predomina (no interior da
consciência) o agir (moral, política, direito), outras
em que predomina o sentir (arte, religião), outras em
que predomina propriamente o pensar (ciência,
filosofia). Quanto mais mediadas são as formas de
consciência social, mais elas dependem da anterior. Por
exemplo, a arte depende mais da moral do que a moral, da
arte.
O nível fenomenal corresponde ao social,
num sentido estrito. O fenómeno, enquanto
manifestação sensível da essência, é e não
é, simultaneamente, a essência. Esta
relação dual com a essência possibilita a
contraposição entre fenómeno e
essência, como uma relação negativa entre elas. Se
não avançarmos até à efectividade, se
absolutizamos os níveis da essência ou do
fenómeno na sua autonomia relativa,
compreendidos sem ligação ao nível do ser e
ao nível da efectividade e o ser humano
será entendido ora como simples ser natural, ora como
ser puramente social, desligado da natureza e também da
sua individualidade
[28].
A efectividade da sociedade
é a plena unidade e identidade entre o fenómeno
e a sua essência (que pressupõe a
recuperação do ser enquanto momento
subsumido da essência)[29].
A sociedade aparece, neste nível, como unidade do
diverso, o ser humano surge como personalidade,
em que a individualidade e o carácter social estão
intrinsecamente unidos, o ser humano é visto como uma
individualidade social, simultaneamente singular e
universal. A efectividade da sociedade
humana é a relação das pessoas enquanto personalidades e
as formas destas relações. O crescimento integral do ser
humano enquanto personalidade passa a ser visto como o
efectivo incremento do todo social
[30].
Portanto, a efectividade do todo social só adquire pleno
desenvolvimento na fase de maturidade social.
Após a exposição lógica da sociedade, e
em relação intrínseca com ela, V.A. Vazyulin dedica-se à
sua explanação histórica.
O estudo da sociedade enquanto totalidade
orgânica deixou claro que a estrutura social também se
desenvolve. Não se alteram apenas as forças produtivas e
as relações sociais, dentro de uma estrutura social em
si imutável, mas transforma-se e desenvolve-se toda a
estrutura e a dialéctica ínsita dos seus momentos.
Assim, modificam-se as relações entre base e
superstrutura, entre os momentos constitutivos da base e
entre os momentos constitutivos da superstrutura e entre
todos estes momentos. Não se pode entender o devir
histórico como um preenchimento, por conteúdos diversos,
de uma grelha estrutural dada. A estrutura da sociedade
burguesa é, pelo pensamento marxista predominante,
extrapolada, até certo ponto, para as sociedades
passadas e futura, mudando apenas o conteúdo dessa
estrutura. Porém, ao longo da história, modifica-se não
apenas o conteúdo, mas também a estrutura social, as
categorias sociais e a sua interacção. Transformam-se
não apenas o singular e o particular, mas também o
geral. Mesmo as categorias sociais e a sua interacção
alteram-se ao longo da história, ou seja, desenvolve-se
o todo social. Por exemplo, a relação entre
base e a superstrutura e a relação dos diversos
elementos da superstrutura só se encontram em separação
máxima no capitalismo, não antes nem
depois. Em “A lógica da história”, V.A. Vazyulin
procurou apresentar, em traços gerais, esta complexa
dialéctica do movimento de toda a estrutura social, da
sociedade enquanto totalidade orgânica.
Ao descortinar a dinâmica interna da
história da humanidade, supera-se a compreensão do
processo histórico enquanto simples sucessão de
formações económico-sociais estruturalmente idênticas
(sociedade comunal
primitiva-esclavagista-feudalismo-capitalismo-comunismo),
em que a estrutura apenas mudaria de conteúdo.
Ao longo da história, a humanidade passa
pelas etapas de início, surgimento,
formação e maturidade. O
início da sociedade corresponde à fase de
constituição das suas premissas sociais no seio da
natureza. Esta é vista na sua relação com o social, como
mecanismo de constituição do social. Existe,
inicialmente, uma unidade imediata entre o ser humano, a
sociedade e a natureza (uma unidade do diverso). O ser
humano ainda apela predominantemente a processos
naturais. Até as relações entre indivíduos, são acima de
tudo, naturais. As relações de produção formam-se no
interior das relações da espécie. A primeira
aparição da sociedade ocorre quando a ocasional e
insustentável utilização de instrumentos dados pela
natureza se torna recorrente e necessária e são
produzidos, de modo contínuo, os primeiros instrumentos
de caça e recolecção. Predominam, todavia, os laços
naturais entre os indivíduos, no seio da comunidade
tribal. Estes laços naturais, biológicos não são
claramente separados do tecido social. O social
já surgiu, começa a ter papel determinante
no progresso social, mas não dominante, uma
vez que predomina ainda a sua identidade com o natural.
O social ainda não penetrou na relação produtiva com a
natureza.
O ponto máximo da comunidade primitiva
foi atingido com a transição para a pecuária e
agricultura (e artesanato). A etapa de formação
da sociedade, aparece como uma negação da anterior.
Aqui, o ser humano passa de mero recolector, a agente
activo do processo produtivo. O trabalho, a produção de
instrumentos de trabalho, a transformação da natureza
pelos seres humanos vai suplantando, aos poucos, os
processos recolectores. Com o surgimento da propriedade
privada e das classes, o social adquire um papel
dominante nas relações entre o ser humano e a natureza,
dando início ao alargamento da diferenciação entre
forças produtivas e relações de produção. De referir que
a propriedade privada surge quando a produção se torna
superior ao mínimo exigido para a sobrevivência e a
reprodução dos membros da comuna primitiva.
A relação social das pessoas com a
natureza e entre as pessoas não aparece de forma
acabada, mas antes desenvolve-se, à medida em que os
processos produtivos de uma natureza transformada pelo
homem adquirem supremacia em relação aos processos
naturais (é um longo percurso. Basta ver que até ao
capitalismo a terra continua a ser o meio de produção
por excelência. Os animais também são usados como
importantes meios de produção).
As relações sociais formam-se
paulatinamente, como unidade de relações sociais e
naturais. As forças produtivas, as relações de produção
e as relações superestruturais aparecem
fundidos, praticamente indiferenciados. Esta
indiferenciação do diverso mantém-se, num
menor ou maior grau, durante todo o período, durante o
qual, a terra, enquanto meio de produção não produzido,
tem uma importância decisiva na produção e a propriedade
privada não suplanta e transforma definitivamente a base
herdada (os escravos e servos ainda são, em certa
medida, não apenas membros das relações de produção, mas
também elementos das forças produtivas, usados na
produção como meios de produção). O feudalismo já é o
período de afirmação da grande propriedade privada,
porém, numa base não adequada. Só com o advento do
capitalismo a propriedade privada se afirma
como propriedade privada, por excelência, de meios de
produção produzidos pelo homem.
No capitalismo o social e o natural
apresentam-se contrapostos, mas mesmo aqui ainda se
mantém o momento de identidade entre o social e o
natural, mesmo no capitalismo a separação entre relações
de produção e forças produtivas não alcança a sua
completa diferenciação. Basta ver que a força de
trabalho do ser humano é um meio de produção e,
simultaneamente, força de trabalho de um membro de
relações de produção. Além disso, o trabalho morto,
convertido em matéria, domina o trabalho vivo.
A etapa de formação da humanidade é o
período de domínio da propriedade privada (e
corresponde, de modo geral, às formações
económico-sociais esclavagista, feudal e capitalista). O
capitalismo leva a propriedade privada ao seu limite
extremo. Com o capitalismo, surgem, porém, as premissas
de um novo tipo de sociedade. Surge a indústria e a
natureza cooperativa do trabalho torna-se uma
necessidade técnica, ditada pela natureza do meio de
trabalho, o processo produtivo adquire um carácter cada
vez mais social. Com o capitalismo, o carácter social do
trabalho torna-se uma necessidade técnica do processo
produtivo. No entanto, não pode atingir, o seu ponto
máximo no seio das relações capitalistas de produção.
Cresce a contradição entre o carácter social da produção
e a sua apropriação privada
[31].
As premissas da etapa de maturidade
social, o comunismo, surgem no capitalismo, como
resultado da mecanização da produção. Com a grande
indústria mecanizada, a natureza eminentemente social do
trabalho torna-se uma necessidade técnica. Surge a
classe operária e elementos superestruturais que
reflectem os seus interesses. Com o tempo, a produção de
bens aproxima-se do nível da satisfação optimal das
necessidades de sobrevivência e reprodução de toda a
espécie humana, tornando, a nível de toda a humanidade,
desnecessária a apropriação de sobreproduto, para
efeitos de sobrevivência.
O aparecimento da futura sociedade tem
lugar quando a classe trabalhadora conquista o poder
político e estabelece a propriedade pública dos meios de
produção (pelo menos, naqueles onde já amadureceu o
carácter social do trabalho).[32]
O socialismo não pode visto como um
estado, harmónica e rapidamente instituído, mas como um
estádio precoce, imaturo, de uma nova sociedade em
formação, estádio que apenas saiu do ventre materno e
traz em si tanto os traços da sua imaturidade como os
resquícios da sociedade passada. Esta nova sociedade
desenvolve-se, necessariamente, através de contradições
internas.
Conforme foi referido, com o surgimento
da grande indústria mecanizada, a natureza cooperativa
do trabalho torna-se uma necessidade técnica.
Incrementa-se o carácter social da produção, que somente
poderá atingir o seu ponto mais elevado na automatização
a integração de toda a produção num complexo produtivo a
nível planetário
[33].
A
contradição fundamental do socialismo, etapa de formação
da sociedade comunista, é a contradição entre a
propriedade social dos meios de produção e a imaturidade
do carácter social da produção. Neste nível, a
propriedade social realiza-se indirectamente, através do
estado, ou seja, o seu carácter formal
predomina sobre o seu carácter real. Nesta
fase, o nível e o carácter do processo produtivo não
permitem a extinção completa da produção mercantil,
sendo, portanto, ainda insuficientes para superar as
contradições entre o interesse privado e o social, entre
a cidade e o campo, entre o trabalho físico e o trabalho
intelectual. A solidez da construção socialista depende,
fundamentalmente, do nível atingido pelo carácter social
da produção
.
Quanto menor for o carácter social real do trabalho do
processo produtivo, maior é o papel impositivo da
superestrutura, maior a probabilidade de discrepância
entre a realidade socialista e o objectivo comunista e
também maior a probabilidade de retrocesso histórico.
A etapa de passagem do desenvolvimento
extensivo para o intensivo,
durante o socialismo, corresponde ao momento em que a
integração e o avanço técnico-científico começam a ser
determinantes e dominantes no processo produtivo.
A não compreensão das contradições
internas imanentes da construção socialista leva,
inevitavelmente, à sobrevalorização do externo e do
contingente (características individuais dos líderes,
resoluções políticas, interferência externa, etc.).
A compreensão da restauração do
capitalismo, ocorrida na passagem do século XX para o
XXI, exige a clarificação da dinâmica interna da
construção do socialismo. A fase das revoluções
socialistas iniciais corresponde, em termos gerais,
à etapa histórica em que o nível do carácter social da
produção (decorrente do nível das forças produtivas) não
permite o desenvolvimento numa base adequada por um
longo período histórico. A fase das revoluções
socialistas posteriores corresponderá a uma etapa
histórica em que o nível do carácter social da produção
será muito mais adequado à integração da produção,
tornando a possibilidade de retrocesso social menos
provável.
O comunismo é uma longa marcha, em cuja
primeira etapa, socialista, a produção ainda não conta
com uma base adequada. Somente com a automatização e
integração de todo o complexo produtivo o comunismo pode
chegar á sua fase superior.
Como vimos, o social vai, ao longo da
história, penetrando e transformando os processos
produtivos naturais em processos produtivos
propriamente sociais. A actuação
directamente ao nível da essência exige um
elevadíssimo grau de preparação teórica, uma vez que o
processo produtivo se transforma totalmente em algo
criado e controlado pelo ser humano. A construção da
sociedade comunista é caracterizada por essa
complexidade
[35].
A transição para o comunismo é uma
negação da negação, ou seja, como que um retorno ao
início histórico. A produção tende para a automatização
completa, torna-se autoprodução integrada e a força de
trabalho do ser humano separa-se das forças produtivas.
Na fase superior, fase comunista stricto sensu, o
ser humano volta a uma relação em que o processo
produtivo ocorre de modo de um modo praticamente
automático, como se tivesse lugar um processo “natural”.
Só com o fim da participação dos seres
humanos enquanto elementos internos subordinados à
produção, o processo produtivo passa a ser controlado,
em vez de controlar. O trabalho deixa, então, de ser uma
obrigação, um meio para garantir a sobrevivência e a
actividade criativa humana torna-se um fim em si mesmo.
O trabalho deixa de ser propriamente trabalho,
torna-se uma actividade cultural integral de
auto-crescimento pessoal e social. Concomitantemente,
supera-se a anterior contradição entre trabalho físico e
trabalho intelectual, base da contradição entre
materialismo e idealismo.
O comunismo é o início de um novo tipo de
desenvolvimento social, é, num sentido rigoroso, não o
fim da história, mas o seu começo
[36].
Marx abriu nova época em termos teóricos,
mas não a fechou. O marxismo é uma teoria em desenvolvimento. Mas, para que tal ocorra, é
exigido o seu conhecimento. Isto significa não um
conhecimento externo da teoria, mas a assimilação do
mecanismo imanente de desenvolvimento da teoria e a
elucidação das suas linhas vectoras. Caso contrário,
estaremos perante um vínculo externo com essa teoria[37],
possibilitador, no melhor dos casos, de uma aplicação
pontual dos seus resultados.
Na relação extrínseca ao marxismo, duas
posições unilaterais se prefiguram: a dogmática e a
revisionista. A posição dogmática procura defender os
resultados da teoria cristalizando-a, matando a sua
vitalidade, impedindo assim o seu desenvolvimento; já o
revisionismo incapaz de desenvolver a teoria, acrescenta
(e contrapõe) à teoria, numa base predominantemente
empirista, novos dados e elementos teóricos, numa
colagem extrínseca, ecléctica, que vai ditando o
afastamento em relação à teoria. Assim, o revisionista
incorpora indutiva, imediata e eclecticamente os “novos
dados” e os conceitos teóricos surgidos no “mercado das
ideias”, mesmo que esses conceitos sejam o mesmo caldo
requentado de posições pretéritas, pré-marxistas (o
entendimento abstracto de direitos e democracia, a
utilização acrítica de conceitos como o de
cidadania, globalização,
utopia, etc.). Para o dogmático, não há nada de novo
sob o sol; para o revisionista, no seu afã de movimento,
tudo parece ser novidade. A absolutização de
determinados momentos do marxismo clássico e a relação
de exterioridade é comum às duas
posições, possibilitando, por exemplo, a passagem fácil
de uma posição dogmática a uma posição revisionista[38].
As posições actualmente predominantes no
que diz respeito à crítica ao capitalismo reflectem o
nível teórico das mesmas. Muitos consideram que basta
criticar o neoliberalismo. Esta posição ainda se move no
interior do paradigma burguês. Mas mesmo entres aqueles
que criticam o capitalismo, muitos consideram que basta
conhecer as mazelas provocadas pelo capitalismo. Porém,
neste caso, a crítica é incompleta e fundamentalmente de
ordem moral, ou seja, padece de idealismo. A crítica à
base económica torna-se uma crítica político-moral, em
que a essência da sociedade é vista apenas
negativamente, como alvo para ataques políticos, não é
vista na sua real existência, os seus mecanismos e a sua
dinâmica não se tornam matéria de apropriação teórica
integral. Se a transformação da sociedade for vista
apenas como resultado da luta política, esta ficará,
inevitavelmente presa ao voluntarismo e a aspectos
conjunturais da realidade. Em relação aos marxistas, na
sua maioria limitam-se, sobretudo, à crítica ao
capitalismo e às posições burguesas (crítica
extremamente necessária mas insuficiente). Para uma
crítica eficaz ao capitalismo é necessário perspectivar
o comunismo e inserir essa crítica na crítica de toda a
pré-história. Se o comunismo for visto como negação do
capitalismo, a contradição histórica será vista sob o
prisma da sua negatividade imediata. O desenvolvimento
efectivo e integral do marxismo exige que se veja o
comunismo enquanto tarefa positiva, de construção de um
tipo novo de sociedade e não apenas de passagem de uma
formação a outra e de negação da formação imediatamente
anterior. Só esta perspectiva permite desenvolver o
marxismo pela sua linha magistral
[39].
Vivemos numa época de recuo histórico,
marcado pelo fim da União soviética e a restauração do
capitalismo nos países socialistas. Esta restauração
representa um enorme retrocesso civilizacional, embora,
numa perspectiva mais ampla esteja inserida num
movimento histórico progressivo, de avanço da humanidade
para o comunismo. Relacionar teoricamente estes
movimentos aparentemente contraditórios, exige a
compreensão de toda a lógica da história. Exige também,
enquanto tarefa inclusa na anterior, o aprofundamento da
teoria do imperialismo
[40].
A compreensão lógica do imperialismo não pode
circunscrever-se ao apontar de características inerentes
à manifestação da essência do capitalismo (exploração,
desemprego, crises, dominação económico-social de nações
inteiras, etc.) nem à crítica politica do imperialismo.
Além disso, não termina na apresentação de
características do imperialismo. Consiste, sim, em
revelar, pela elucidação lógica e histórica, a dinâmica
interna do imperialismo.
Todo o
ataque actual às conquistas sociais tem uma relação
directa com o fim da União Soviética enquanto vitória
contra-revolucionária sobre o futuro. A União Soviética
não era só um estado que se contrapunha ao domínio
imperialista, mas um avanço efectivo na superação da
pré-história da humanidade
.
Mas o temporário “vencedor” tem pés de barro e não pode
vencer as suas próprias contradições. O tempo em que
vivemos não é um regresso ao passado pré-soviético. É
uma época que não se assemelha inteiramente ao início do
século XX. É, sim, uma fase em que o capitalismo
expande, definitivamente, de modo extensivo e intensivo,
toda a sua potencialidade histórica, atingindo o limite
último, para além do qual perante a humanidade não
restará alternativa que não seja a sua superação.
Assim que o capitalismo se viu relativa e
temporariamente livre do embate contra o futuro, os seus
olhos voltaram-se para a sua expansão estratégica e para
um ajustar de contas com o seu passado.
Ásia, África, América Latina, por todo o planeta as
relações não-típicamente capitalistas, criadas e
reproduzidas, em parte, pelo mesmo capitalismo, são
forçadas a transformar-se em relações capitalistas
padrão
[42].
Em grande parte esta contradição imprime o seu carácter
à luta anti-imperialisa. Claro que esta luta contra o
imperialismo não deixa de ter, em si, momentos de
passado e futuro, a luta anti-imperialista na Ásia e não
só, une elementos de defesa de relações
pré-capitalistas, capitalistas e socialistas, numa
amálgama que o tempo acabará por decompor. A luta
imperialista em todo o mundo, nomeadamente na América
Latina, realiza, em grande parte, tarefas mais
anti-imperialistas do que socialistas. Mantém, no
entanto, o fio (e o fito) condutor revolucionário,
necessário para a tomada futura de posições mais
consequentes
[43].
Como foi dito no início deste artigo,
nunca na história uma nova formação económico-social se
estabeleceu sem recuos temporários e esta verdade ainda
mais fundamental é para uma formação que pretende não
apenas superar a anterior formação mas toda a
pré-história da humanidade. É inevitável que a uma fase
inicial de revoluções socialistas se siga uma nova fase
de revoluções socialistas, com muito mais possibilidades
de êxito, uma vez que o carácter social da produção se
encontrará num patamar muito mais adequado à construção
do comunismo. O período soviético não é algo do passado,
mas do futuro. Não é apenas uma tentativa falhada, mas a
primeira, a mais heróica das tentativas
[44],
que deve ser estudada se quisermos iluminar teoricamente
o futuro a construir.
Efectivamente, a história não é a avenida
Nevsky. Numa comparação geograficamente mais contígua,
poderia ser afirmado que a história não é como a Avenida
da Liberdade, embora ela seja a autêntica
avenida da liberdade da humanidade.
Luís Rafael Gomes
BIBLIOGRAFIA
·
Актуальность методологии марксизма и
перспективы её развития: Материалы
Международной Научной Конференции, приуроченной к выходу
в свет монографии В. А. Вазюлина «Логика «капитала»
Карла Маркса», Москва 2003 (A pertinência do
método do marxismo e perspectivas do seu
desenvolvimento: actas da Conferência Científica
Internacional consagrada à publicação da monografia de
V.A. Vazyulin "A lógica de “O Capital” de K.
Marx",Moscovo, 2003.
·
Вазюлин, В.А., Диалектика исторического
процесса и методология его исследования. М "1978 (A
dialéctica da história e a metodologia da sua
investigação. M 1978).
·
Вазюлин, В.А., Логика "Капитала" К.
Маркса. М., 1968 (A lógica de “O Capital" de K. Marx.
M., 1968).
·
Вазюлин, В.А., Логика истории. М., 1988
(A lógica da história. M., 1988).
·
Вазюлин, В.А., О социальной философии
истории / Социологические исследования. 1992. № 12
(Sobre a filosofia social da história / estudos
sociológicos. 1992. № 12).
·
Вазюлин, В.А., Становление метода
научного исследования К. Маркса (логический аспект). М.,
1975 (A Constituição do método de investigação
científica de K. Marx (aspecto lógico). M., 1975).
·
Труды Международной Логико-Исторической
Школы (Млиш) Выпуск 1, "Логика истории и перспективы
развития науки", Москва, 1993 (Obras da Escola
Internacional da Lógica da História, fascículo 1, A lógica da história e das perspectivas de
desenvolvimento da ciência, Moscovo, 1993).
·
Труды Международной Логико-Исторической
Школы (Млиш), 2 Выпуск ", История и реальность: уроки
теории и практики, москва, 1995 (parte 2 (1995),
História e Realidade: Lições da teoria e prática,
Moscovo, 1995).
·
Albritton, R. and Simoulidis, J.,
New dialectics and political economy,
Palgrave Macmillan,
New York, 2003.
·
Barata-Moura, J., Materialismo e
subjectividade. Estudos em torno de Marx, Lisboa,
Avante, 1997.
·
Ilyenkov, E. V., A dialéctica do
abstrato e do concreto no "Capital" de Marx. Moscou,
Progress, 1982.
·
Néstor Kohan, El método
dialéctico de lo abstracto a lo concreto,
dialéktica. Revista de Filosofía y teoría social, Ano I,
número 2, Buenos Aires, octubre de 1992.
·
Kosik, K., Dialéctica do
concreto. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.
·
Marx, K., Engels, F., Lenin, VI: em
http://www.marxists.org.
·
Moseley, F., Marx's method in
"Capital": a re-examination, Atlantic Highlands,
N. J., Humanities Press, 1993.
·
Murray, P., Marx's theory of
scientific knowledge, Atlantic Highlands, N. J.,
Humanities Press, 1988.
·
Rosdolsky, R., Gênese e estrutura de
“O Capital” de Karl Marx, Rio de Janeiro:
Contraponto, 2001.
·
Saad Filho, A.,
Re-reading
both Hegel and
Marx: the "new dialectics" and the
method of Capital,
Revista de Economia
Política, vol. 17, na 1 (65), janeiro-março/97, (http://www.rep.org.br/pdf/65-6.pdf).
·
Shamsavari, A., Dialectic and
social theory: the logic of “Capital”, Braunton,
Merlin Books, 1991.
·
Smith, Th., The logic of Marx's
Capital: reply to Hegelian criticisms, Albany,State of
New York Press, 1990.
·
Zeleny, J., The logic of Marx,
Rowman and Littlefield, Totowa, New Jersey,
1980.
·
http://www.ilhs.tuc.gr/fr/index.htm